Ao longo do ano de 2020 e no início de 2021, Cácia Pimentel se dedicou à produção do livro "Caminhos Jurídicos e Regulatórios para a descarbonização no Brasil", que contou com o apoio da Sabin Center for Climate Change Law, instituição parceira da Universidade de Columbia, uma referência mundial em mudanças climáticas.
"Em termos regulatórios, temos um arcabouço jurídico muito bom, mas que precisa ser mais bem implementado. Além do desmatamento ilegal, temos também desafios em relação à transição energética e alguns outros pontos, como, por exemplo, a dependência do transporte rodoviário de cargas baseado em diesel", explicou a Cácia, especialista nas áreas de Direito da Energia, Ambiental Econômico, Constitucional Administrativo, com foco em sustentabilidade, contratos, energias renováveis, compliance e ESG.
Como transformar essa realidade? "Modernizando a nossa infraestrutura e aproveitando as excelentes condições que o Brasil tem na sua matriz energética. Caminhos possíveis: a reforma tributária verde e a criação de meios de financiamento público e privado, que viabilizem novos projetos de baixo carbono, que possam gerar créditos qualificados no mercado de carbono", acrescentou.
Em setembro, uma nova produção ganhou destaque no site da Columbia Law School: o artigo "O Mercado de Carbono e sua Regulação no Brasil", elaborado por Cácia em parceria com Weber Amaral (Membro do Conselho de Especialistas da DEEP ESG) e Gabriel Wedy (Juiz Federal; Pós-Doutor, Doutor e Mestre em Direito Ambiental).
"O Brasil pode contribuir mais rapidamente para o sequestro de carbono por meio de medidas rigorosas contra o desmatamento e a adoção de técnicas cada vez mais avançadas e sustentáveis para substituir práticas agrícolas mais intensivas em carbono", destacou o artigo.
Questões centrais apontadas pelo artigo em relação ao momento atual e às oportunidades do desenvolvimento do mercado de carbono no Brasil:
Fundo Nacional sobre Mudança do Clima
"O Brasil ainda não possui um mercado regulado de carbono operante. Mas percebemos alguns avanços. A pressão social e do Supremo Tribunal Federal pela proibição do contingenciamento do Fundo Nacional sobre Mudança do Clima (FNMC, criado pela Lei n. 12.114/2009 e regulamentado pelo Decreto n. 9578/2018, os quais definem a aplicação de seus recursos, incluindo atividades de projetos de redução de emissões de gases de GEE, além de formas de difusão de tecnologia) ampliou o debate e certamente resultou em normativos voltados, em boa hora, para ações de mitigação, como a estruturação do mercado de carbono".
Mercado Brasileiro de Redução de Emissões (MBRE)
"Em meio a uma parca estrutura jurídica, destacam-se a Lei n. 12.187/2009 e o Decreto n. 11.075/22, que inauguram o Mercado Brasileiro de Redução de Emissões (MBRE), embora ainda careçam de regulamentação. O MBRE, quando estiver em operação, permitirá que os créditos certificados sejam registrados no Sistema Nacional de Redução de Emissões de Gases de Efeito Estufa (SINARE), uma plataforma para registro dos dados de emissões e consolidação do comércio e da transferência de créditos de carbono. O mercado regulado brasileiro, segundo artigo 9º do Decreto n. 11.075/2022, deverá ser operacionalizado em bolsas de mercadorias e futuros, bolsas de valores e entidades de balcão organizado, autorizadas pela Comissão de Valores Mobiliários – CVM, onde se dará a negociação de títulos mobiliários representativos de emissões de gases de efeito estufa evitadas e que possam ser certificadas".
Próximos passos
"O artigo 3º do Decreto n. 11.075/2022 aponta a competência do MMA, do Ministério da Economia e outros ministérios setoriais para a elaboração dos Planos Setoriais de Mitigação das Mudanças Climáticas. De igual modo, ainda se aguarda a edição do Ato conjunto a que alude o artigo 8º, parágrafo 1º, que disponibilizará as regras sobre registro, padrão de certificação, gestão e operacionalização do SINARE, formas de credenciamento de certificadoras e centrais de custódia, critérios de compatibilização e registro digital dos créditos. Não há referência na norma pátria sobre as formas de financiamento público e privado para a estruturação desse novo mercado, considerando a configuração geopolítica mundial".
Cap-and-trade
"É possível prever que a legislação brasileira deverá adotar o sistema de cap-and-trade, com a definição do volume máximo de GEE que poderá ser emitido pelos setores elencados pela norma. Essa previsão poderá trazer segurança jurídica para o mercado regulado, ao passo em que atenderá ao princípio da estrutura de transparência aprimorada na compensação, em cumprimento aos compromissos firmados no âmbito das Nações Unidas. Espera-se que o mercado regulado brasileiro seja colocado o quanto antes em um arcabouço regulatório sólido e ambientalmente sustentável. O sucesso do mercado regulado dependerá de uma boa governança política, que coordene os objetivos dos compromissos climáticos e as políticas macroeconômicas do país que precisam absorver as externalidades negativas da poluição".
Mercado Voluntário
"O mercado voluntário já está operante e precisa crescer, de modo que as oportunidades ambientais do Agronegócio não sejam desperdiçadas. Segundo estimativas, os investimentos em Soluções Baseadas na Natureza (do inglês, NBS) devem triplicar até 2030 e quadruplicar até 2050. As NBS, onde se encontram as atividades mais intensivas de retenção e sequestro de carbono, certamente prometem um maior valor agregado ao crédito comercializado e retornos financeiros mais prósperos para o Agronegócio".
Planejamento estratégico
"O ponto nodal é que as emissões brasileiras se encontram mais atreladas ao desmatamento ilegal e à agropecuária sem compromisso carbono neutro. Assim, sugere-se que o Estado adote um planejamento estratégico integrado e desburocratizado, com políticas públicas moduladas a partir dos melhores diagnósticos científicos, para que haja o desenvolvimento de três caminhos jurídicos e regulatórios prementes para o crescimento econômico sustentável: a absorção no processo produtivo das técnicas de fixação do carbono no solo, a partir da adoção de novas práticas e de inovações tecnológicas; o desenvolvimento do mercado de carbono, tanto o regulado, quanto o voluntário, com as condições para que este último se desenvolva com menor ou nenhuma intervenção; e, por fim, as NBS, como atividades econômicas que auxiliam na redução das emissões e geram mais riqueza e prosperidade com equidade, para os produtores e para as comunidades tradicionais envolvidas".
Link para a íntegra do artigo: https://scholarship.law.columbia.edu/sabin_climate_change/193/
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CÁCIA PIMENTEL
Doutora em Direito Político e Econômico pela Universidade Presbiteriana Mackenzie (Bolsa mérito); Visiting Scholar pela Universidade de Columbia; Mestre pela Cornell University, New York; MBA pela FGV-DF em Direito Econômico e das Empresas. Professora Convidada do Instituto de Estudos Avançados da USP (IEA/USP). Consultora em Compliance Ambiental.