Sob a perspectiva de investimento a dimensão do Impacto está intimamente ligada a dois fatores relevantes: o primeiro diz respeito aos efeitos deste impacto e sua dinâmica no risco-retorno, sua aplicação e função econômica, social ou ambiental; o segundo, ao elemento, ou elementos, da materialidade econômica provocada pela ação do investimento nesta mesma dinâmica. Em outras palavras, o impacto em termos reais é a medida do benefício de uma ação humana para a sociedade como um todo e para o meio-ambiente ou o planeta. Essa é a dimensão positiva do impacto, mas a medida deste benefício pode ter uma dimensão negativa que precisa ser levada em consideração nesta dinâmica risco-retorno, sua aplicação e função. Por isso, “não há como desassociar a dimensão dos impactos sobre os investimentos sem que os atrele a este conceito de dupla materialidade”. [Paulo Miranda]
O conceito de materialidade dinâmica reconhece que a materialidade econômica de uma questão pode mudar com base em circunstâncias previstas ou inesperadas. O que é financeiramente imaterial para uma empresa ou setor hoje pode se tornar material amanhã, um processo chamado ‘materialidade dinâmica.
O ex-juiz da Suprema Corte dos EUA Thurgood Marshall, em um caso histórico em 1976, escreveu que um item é material se houver “uma probabilidade substancial de que um investidor razoável considere a informação importante para decidir como votar ou tomar uma decisão de investimento”.
Os críticos da proposta atual da SEC argumentam que o princípio de materialidade existente é suficiente para incorporar questões climáticas ou outras questões ambientais, sociais e de governança corporativa (ESG) nos relatórios das empresas. Por outro lado, a SEC e os defensores das novas regras dizem que, embora muitas empresas americanas estejam divulgando muitos dados sobre suas atividades climáticas, as informações são inconsistentes e não padronizadas, o que dificulta a comparação para os investidores. Novas regras de divulgação são necessárias para preencher as lacunas de informação. E quando se trata de materialidade servindo como determinante para o que as empresas devem e não devem divulgar, há uma incerteza significativa sobre o que é realmente material.
Embora haja pontos de vista diferentes entre os que acreditam que a materialidade (ou relevância de fatores de ESG) seja definida pela performance financeira da empresa ou setor resultante do gerenciamento de fatores de ESG e aqueles que apontam a materialidade como definida pelo impacto social ou ambiental de determinado fator, o fundamental para quem investe em ESG é entender o conceito de materialidade para seu próprio negócio.
A dupla materialidade, um conceito introduzido recentemente por reguladores europeus, é cada vez mais para onde olham os investidores e gestores de fundos, para compreender os riscos de seus investimentos nos pilares socioambientais, mas, também, para a rentabilidade das empresas nas quais investem, e como os impactos socioambientais podem ter consequências financeiras, ao longo dos anos, para seu próprio investimento. Outra forma de ver a dupla materialidade é entender o impacto da sustentabilidade sobre as finanças e, também, sobre a sociedade e o meio ambiente.
Alguns especialistas argumentam que o significado da dupla materialidade ainda está em debate e requer uma análise mais aprofundada. “Sim, em princípio, os impactos de uma empresa ou portfólio no clima ou no ambiente mais amplo podem ser materiais – mas como sabemos exatamente o que é um impacto material?” pergunta Matthias Tager, doutorando em Política e Desenvolvimento Ambiental na London School of Economics.
A Reset Capital aponta, como exemplo, que a emissão de CO2 de um banco não é tão relevante quanto a pegada de carbono de uma petroleira. Para um banco, apontar avanços na emissão de GHG pode até ser tido como greewashing, ou seja “quando a empresa faz alarde sobre a melhoria de uma métrica ESG irrelevante no seu negócio e deixa de fazer o dever de casa no que realmente importa” segundo a Reset.
Neste exemplo específico, James Giffor, responsável por consultoria sobre impacto do Credit Suisse, acredita que “Descarbonizar seu portfólio não é o mesmo que montar uma carteira que ajude a descarbonizar o mundo. Obrigar empresas a reduzirem emissões e reorganizarem seus negócios para um futuro de baixo carbono pode ser um processo árduo e complicado, então investidores que desejam promover mudanças devem escolher sua abordagem com sabedoria.”
“Eu acredito que cada perspectiva da noção de dupla materialidade precisa ser considerada em seu próprio ambiente. Não é a convergência das duas perspectivas que torna uma questão material. Impactos no meio ambiente e a sociedade não podem ser despriorizados com base no fato de não serem financeiramente materiais, ou vice-versa. Além disso, uma empresa deve começar com a avaliação do componente de impacto externo do princípio da dupla materialidade, seguido pela identificação do subconjunto de informações financeiramente materiais para a empresa e stakeholders”, disse Peter Paul van de Wijs GRI Chief External Affairs, em uma publicação da GRI.
Neste aspecto, especialistas da SASB (Sustainability Accounting Standards Board) , citados pelo Financial Times (https://www.ft.com/content/92915630-c110-4364-86ee-0f6f018cba90) , destacam a importância de “entender o público que se visa ao reportar sobre sustentabilidade”.
A resposta, segundo Matthias Tager, depende fundamentalmente da visão de porque as informações sobre impactos ambientais devem ser materiais em primeiro lugar. Na sua opinião, há duas razões prováveis: “Os impactos ambientais podem se traduzir em riscos financeiros, por exemplo, por meio de responsabilidades legais ou danos à reputação de uma empresa. Uma pessoa razoável pode considerar o material informativo por outros motivos que não as repercussões financeiras diretas. A questão do que significa dupla materialidade se transforma em uma questão de quem é a ‘pessoa razoável’ e quais são seus interesses, que por sua vez definem o que conta como material – em outras palavras, [o que é] importante para eles”.
Três perguntas para…
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Dado que a dupla materialidade é o foco dos investidores, como devem as empresas e organizações elaborar seus reports, se estiverem em busca de investimento?
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Enquanto os parâmetros de ESG não chegam à unificação global, como as empresas que buscam demonstrar dupla materialidade devem buscar parâmetros para disclosure?
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E quanto aos investidores? Como decidem sobre seus investimentos tendo em vista a sopa de letrinhas em que os parâmetros de ESG ainda se encontram?
A resposta, diz Tager, depende fundamentalmente da visão de por que as informações sobre impactos ambientais devem ser materiais em primeiro lugar. Na sua opinião, há duas razões prováveis:
Os impactos ambientais podem se traduzir em riscos financeiros, por exemplo, por meio de responsabilidades legais ou danos à reputação de uma empresa.
Uma pessoa razoável pode considerar o material informativo por outros motivos que não as repercussões financeiras diretas. “A questão do que significa dupla materialidade se transforma em uma questão de quem é a ‘pessoa razoável’ e quais são seus interesses, que por sua vez definem o que conta como material – em outras palavras, [o que é] importante para eles”, Tager explica.