Entrevista exclusiva com a professora do ITA Sueli Sampaio Damin Custódio
Renomada professora e pesquisadora brasileira, Sueli Sampaio Damin Custódio atua como Chefe do InovaLab do Instituto Tecnológico de Aeronáutica (ITA). Com vasta experiência em gestão e políticas educacionais, coordena o Programa de Pós-graduação em Propriedade Intelectual e Transferência de Tecnologia para a Inovação (PROFNIT) e lidera iniciativas para promover a inclusão de mulheres nas áreas de Ciência, Tecnologia, Engenharia e Matemática (STEM). Sua trajetória acadêmica inclui formação em Direito, com mestrado e doutorado focados em temas relacionados a filosofia, cultura, política e sociedade.
Professora Sueli, como você vê o cenário atual da participação feminina nas áreas de ciência e tecnologia no Brasil?
Infelizmente, tomando como exemplo o ITA, a gente não consegue sequer atingir 10% de mulheres nos cursos de engenharia. Claro que isso não é algo isolado, exclusivo do ITA. Em determinadas áreas da engenharia, isso é mais grave do que em outras. Depende do curso, mas, normalmente, a diferença é grande.
Quais são os principais desafios para aumentar essa participação?
São vários! O primeiro é sensibilizar e incentivar meninas para o ingresso nessas áreas. Estamos falando da Educação Básica. Depois, temos que identificar os fatores que contribuem para fixar ou afastar essas jovens da área. Existem aspectos culturais e também de como as mulheres acabam se percebendo dentro das organizações que precisam ser trabalhados.
Como esses desafios se manifestam ao longo da carreira das mulheres?
Quando a mulher sai da universidade e precisa ingressar no mercado de trabalho, vêm outros desafios. O primeiro deles diz respeito às diferenças salariais. Também existem desigualdades de oportunidades e de condições de trabalho. Por fim, o fato de não alcançarem cargos estratégicos e de liderança nas organizações muitas vezes faz com que elas tenham suas carreiras limitadas ou abreviadas.
Você mencionou a questão da autopercepção das mulheres. Por que isso é importante?
Quando elas se habilitam para determinados cargos, sentem que precisam estar 100% preparadas, mais do que os homens. Como se precisassem chegar perto da perfeição para poder concorrer a essas posições. O nível de exigência é muito diferente. Temos diversos depoimentos que atestam isso, inclusive de mulheres que ocupam hoje posições de diretoria, presidência, vice-presidência.
Quais iniciativas têm sido tomadas para enfrentar essa realidade?
Temos atuado fortemente para criar uma base de meninas interessadas na área de ciência e tecnologia e incentivá-las a seguir adiante. Também buscamos que o Estado identifique as desigualdades e promova, por intermédio de políticas públicas, ações de fomento para o ingresso e a fixação das meninas e jovens nessas carreiras.
Como você vê a evolução dessa pauta nos últimos anos?
As mudanças, no meu ponto de vista, não vêm na velocidade adequada. Mas esses processos são complexos; não se muda uma cultura de um dia para o outro. Ao propor este debate, ao identificar isso como uma questão importante, que não é exclusivamente do indivíduo, mas da sociedade, do governo e das empresas, você começa a perceber uma atuação social importante como elemento de pressão.
Qual o papel dos homens nessa mudança?
Isso não é uma cruzada das mulheres. Estamos falando de mães, companheiras, filhas, amigas, colegas… Ou seja, se considerarmos nossas relações sociais, não dá para restringir esse movimento como se só nós fôssemos interessadas na mudança. Além disso, para mim, é uma condição necessária para que possamos dizer que temos de fato uma cultura de cidadania.
Para finalizar, qual mensagem você deixaria para as mulheres que desejam seguir carreira em STEM?
A mulher pode ser o que ela quiser ser. E ninguém deve dizer o que ela tem que ser. Se quiser seguir uma carreira ligada à área de cuidado, ótimo! Se não quiser, isso tem que ser respeitado. O importante é que tenhamos igualdade de interlocução e de contribuição para finalmente termos um verdadeiro projeto de país.